ASES DO JUDÔ BRASILEIRO
MITSUYO MAEDA – CONDE KOMA
Tem Mitsuyo Maeda, o célebre Conde Koma, a primazia nos anais do judô brasileiro, não havendo outros registros que antecedam aos deste personagem, e portanto, a sua primazia na história deste livro. Porém essa primazia se deve também pela sua atuação na implantação, divulgação e consolidação dessa arte entre nós, trabalhos esses que desenvolveu desde a sua chegada em 1914 até a sua morte em Belém do Pará no dia 28 de novembro de 1941.
MITSUYO MAEDA, O CONDE KOMA
CONDE KOMA EM UMA DE SUAS LUTAS
CONDE KOMA (1º EM PÉ A DIREITA ) E SUA PRIMEIRA TURMA DE ALUNOS NO BRASIL
MITSUYO MAEDA, O CONDE KOMA CONDE KOMA EM UMA DE SUAS LUTAS CONDE KOMA (1º EM PÉ A DIREITA) E SUA PRIMEIRA TURMA DE ALUNOS NO BRASIL
MITSUYO MAEDA, O CONDE KOMA
CONDE KOMA EM UMA DE SUAS LUTAS
CONDE KOMA (1º EM PÉ A DIREITA) E SUA PRIMEIRA TURMA DE ALUNOS NO BRASIL
Foram portanto vinte e sete anos vividos no Brasil, nos quais desenvolveu também um intenso trabalho pela imigração japonesa no norte do país, mas cujos resultados infelizmente não corresponderam ao seu sonho que era dar melhores condições de vida aos seus patrícios e ver florescer na Amazônia a civilização japonesa.
Personalidade marcante, granjeou por todos os lugares que passou, o respeito, a estima, a consideração , mercê de suas altas qualidades de esportista, cívicas e morais, aliada a uma simpatia natural que segundo consta, foram os motivos pelos quais recebeu o título de Conde Koma, já que a sua postura irradiava nobreza, dignidade e distinção. Esse título entretanto não é oficial e a sua origem é desconhecida.
Nasceu Mitsuyo Maeda na vila de Funazawa, na cidade de Hirosaki e na província de Aomori, no dia 18 de dezembro de 1878, estudou na Universidade de Waseda onde posteriormente lecionou judô. Ingressou no ano de 1894 no Kodokan e já em 1900 ou pouco mais imperava absoluto nos “tatames” de seu país. Porém, em seus sonhos voltava os olhos para outras partes do mundo…Sonhava enfrentar lutadores de outros estilos de lutas, de outras raças, e essa oportunidade não tardou.
Após o profícuo trabalho desenvolvido por Yoshikazu Yamashita nos Estados Unidos da América entre 1902 e 1904, quando se deu o seu retorno ao Japão, o Presidente Theodore Roosevelt instigado por sua filha Allis, através dos canais competentes solicita que sejam enviados substitutos para dar continuidade aos trabalhos iniciados por Yamashita e sua esposa Fudeko, indo essa petição parar no Kodokan, onde mestre Jigoro Kano determinou que Tsunejiro Tomita, Nobushiro Satake e Mitsuyo Maeda partam para a América afim de atender o seu Presidente, e ainda, consolidar e divulgar o judô nesse país. Isso era tudo o que Maeda queria, e assim partem eles em1906 para a grande aventura, a grande viagem que segundo consta não haveria volta para Maeda e Satake.
Chegados, foi marcada uma primeira apresentação para o Presidente e sua filha Allis, membros da colônia japonesa, personalidades e representantes dos meios de comunicação. Tomita portando então o sexto grau mais pelos seus trabalhos burocráticos que por suas qualidades de lutador, de complexão física pequena mesmo para os padrões de sua pátria e já no ocaso de sua carreira, contra a vontade de Satake e Maeda, teimosamente enfrenta por indicação de Miss Allis, a Bill Owens, um gigante cubano, negro, com 1,94 m. de altura e mais de cem quilos de peso que, literalmente esmaga o lutador japonês que pesava pouco mais de sessenta quilos.
Após o desastre, Satake e Maeda enfrentando a ira dos componentes da colônia japonesa ali presente, que sentiam-se envergonhados com a contundente derrota, prometem resgatar a honra e o conceito do judô japonês, e para tanto decidem ficar no país e partem para desafios que, um a um vão sendo vencidos, atingindo a marca de aproximadamente cem lutas sem uma só derrota, cumprindo assim a promessa feita aos seus concidadãos. Tomita envergonhado e triste volta de imediato para o Japão, antes porém, reconhece que o seu tempo já passou, e que a responsabilidade agora é da nova geração.
De toda as lutas realizadas em território, talvez a de maior repercussão e importância foi contra Butch Boy em 1907 em New York. Esse lutador também esteve presente no encontro de Tomita com Bill Owens, e dizendo-se mais forte que o negro cubano, e que Tomita portando o sexto grau era melhor que Maeda que era quarto, portanto, dava como certa a sua vitória, e isso ele alardeou por todos os cantos, inclusive que Maeda não teria a mínima chance de vencer. O que se viu na realidade foi Butch Boy ser arremessado seguidamente com uma variedade impressionante de golpes e terminar ante uma chave de braço confessar a sua derrota de forma humilhante. (*)
(*) – Butch Boy – 1,80 m. de altura – 113 quilos
Mitsuyo Maeda – 1,64 m. de altura – 68 quilos
Cumprida a missão a que se propuseram na América, Maeda e Satake partem para o México desembarcando no porto de Vera Cruz em 17 de Julho de 1909 em meio a um grande estardalhaço motivado pelas notícias oriundas do país vizinho, as quais os endeusavam e davam como invencíveis os dois lutadores japoneses.
Assim, prossegue no México a marcha vitoriosa da dupla japonesa, na qual enfrentando adversários das mais diversas nacionalidades, mostraram um preparo físico e uma técnica insuperável que prevalecia sobre os lutadores que pressurosos vinham de todos os cantos em busca da glória de derrotar os fenômenos japoneses. Nessa época Satake já pouco lutava, preferindo dar aulas nas Universidades, Forças Armadas e outras instituições. Entre as lutas efetuadas por Maeda no México houveram algumas bem difíceis como a realizada contra o gigante alemão Storvan, contra o turco Totorar, o francês Jane, Goold Larry e Capio que “agarrava os touros a unha” e os matava com um soco na cabeça, todos com mais do dobro do peso de Maeda.
Do México partem para Cuba onde novas vitórias foram conquistadas frente a todos os tipos de lutadores, desde os mais corretos até os mais “sujos”, impondo contundentes derrotas à todos os que se interpunham na sua trajetória. Contavam agora Maeda e Satake com a companhia dos seus patrícios Ohno Akitarô e Ito Tokugorô (*)
(*) – Ohno Akitarô e Ito Tokugorô chegaram a Cuba em 1909/1910 vindos da Inglaterra, onde junto com Yukio Tani e Gunji Koizumi e ainda outros mestres ensinavam o jiu-jitsu. Por volta de 1910, dado o desinteresse, há uma debandada geral, ficando na Inglaterra apenas Yukio Tani que é tido como o introdutor do jiu-jitsu na Europa.
De Cuba partem Maeda, Satake e Ito Tokugorô para a Europa, e a começar pela Rússia passam pela Alemanha, França, Itália e Inglaterra. Na Itália Maeda contunde-se no pé, mas mesmo assim, nas três demonstrações que efetuou na Inglaterra mostrou toda a sua vitalidade e perícia na arte das lutas. Entretanto quem mostrou toda a sua pujança física contra mais de quarenta adversários foi Ohno Akitarô, que desse país decide voltar para o Japão. Foram apenas duas semanas de estada do trio na Inglaterra, onde foram recepcionados por Yukio Tani e Gunji Koizumi que ai ensinavam jiu-jitsu desde 1899 e 1906 respectivamente. Da Inglaterra partem Maeda e Satake para a Bélgica e depois para a Espanha, e Ohno que esteve nesse país de 1905 a 1909 volta para a sua pátria onde viria morrer prematuramente(*).
(*) – Em 1920 chegam juntos a Londres os mestres Jigoro Kano e Hikoichi Aida, e convidados pelo fundador do Kodokan, Yukio Tani e Gunji Koizumi decidem abandonar o jiu-jitsu e ingressar no Kodokan, já no segundo grau dada a experiência e conhecimentos que tinham nas artes das lutas. Hikoichi Aida permanece em Londres após a volta do mestre Jigoro Kano, juntando-se aos seus dois compatriotas na implantação e consolidação do judô na Inglaterra. Sobre essa mudança, assim se expressou Gunji Koizumi em seu livro “Mi Estúdio de Judô” : “Influíram nesta motivação o fato de que o Kodokan foi fundado como uma instituição educativa, livre de interesses comerciais e cujo objetivo era facilitar o estudo e a prática dessa arte como meio de aperfeiçoamento físico, mental e ético que torna essa arte matéria cientifica e progressista mediante o principio de máxima eficiência com um mínimo de dispêndio de força”.
Na Bélgica foram efetuadas apenas duas demonstrações, e depois atravessando a cordilheira dos Pirineus chegam a Espanha, país que encantou os nossos personagens e onde se tornam famosos, principalmente em Madri e Barcelona. Porém nesse país o espaço para o judô era limitado, pois Maeda e Satake não encontrando adversários sentem os dias vazios e a vida sem sentido.
Decidem então voltar para a América, mas já com os olhos voltados para a grandiosa imensidão da Amazônia do Brasil. Partem então de volta para a América Central via Estados Unidos, passando por Cuba, Guatemala, Honduras, Costa Rica e Panamá, depois Colômbia, Equador, Peru, Chile, Argentina, Uruguai e Brasil (*)
(*) – São muito contraditórias as informações que nos chegam a respeito das datas e roteiros das viagens de Mitsuio Maeda e Nobushiro Satake, como também sobre a origem do seu título nobiliárquico, oque impossibilita uma avaliação melhor das suas andanças. Portanto, do estudo do material que nos chega as mãos, apresentamos um trabalho que se não absolutamente certo, se aproxima bastante da trajetória dos personagens em pauta.
ROTEIRO DE VIAGENS
Estados Unidos_____1906
México____________1909/1910
Cuba_____________ 1910
Europa____________1911
América Central____ 1912/1913
América do Sul_____ 1913/1914
Brasil_____________ 14/11/1914
TITULO NOBILIÁRQUICO – Também aqui há um desacordo generalizado sobre a origem do título dado a Mitsuio Maeda, entretanto, tem-se como do próprio Maeda esta declaração a um repórter de uma revista européia: “Um eminente cidadão espanhol me atribuiu o titulo de Conde Koma pelas minhas vitórias nas lutas e aparência física, e o povo, carinhosamente passou a usa-lo em detrimento do meu próprio nome.
Depois da América Central chegam a Colômbia e Equador, depois o Peru onde veio se juntar a Maeda e Satake o seu compatriota Laku, que nesse tempo ministrava aulas nas entidades militares desse país. Segue-se o Chile onde encontram Okura que também junta-se na peregrinação. Outro a agregar-se ao grupo é Schimitsu na Argentina, formando agora um quinteto que passando pelo Uruguai chega a Porto Alegre no dia 14 de novembro de 1914. De Porto Alegre, São Paulo, depois o Rio de Janeiro, Salvador, Recife, São Luiz, Belém e Manaus no dia 18 de Dezembro de 1915. Os jornais da capital amazonense noticiaram assim a chegada dos lutadores japoneses:
O TEMPO – 18 DE DEZEMBRO DE 1915
Chega hoje a bordo do paquete “Pará”, a troupe de lutadores japoneses de jiu-jitsu, que vem fazer as delicias dos freqüentadores do popularíssimo Theatro Politheama. Esta troupe é chefiada pelo Conde Koma, campeão mundial de jiu-jitsu, que desembarcará em trajes orientais, percorrendo as ruas em automóveis. Desta afamada troupe fazem parte: Satake campeão de New York, Okura campeão do Chile, Schimitsu campeão da Argentina e Laku professor nas entidades militares do Peru.
CORREIO DA MANHÃ – 23 DE DEZEMBRO DE 1915
Grande luta entre o Conde Koma e o lutador de boxe Barbadiano Adolpho Corbiniano.
CORREIO DA MANHÃ – 24 DE DEZEMBRO DE 1915
Code Koma derrota Barbadiano. O derrotado torna-se discípulo.
TEMPO – 27 DE DEZEMBRO DE 1915
Os sportman Severino Silva (luta romana) e Adolpho Corbiniana (boxe), realizam apresentação de jiu-jitsu supervisionados pelo Conde Koma. Os mesmos são discípulos do Prof. Okura, campeão do Chile
O TEMPO – 08 DE JANEIRO DE 1916
Seguem hoje pelo paquete vapor Antony, a troupe de lutadores de jiu-jitsu: Conde Koma, Okura e Schimitsu. Laku e Satake continuam administrando aulas de jiu-jitsu em Manaus a quem possa interessar A troupe segue com destino a Liverpool.
Da sua segunda viagem a Europa em companhia de Okura e Schimitsu pouco se sabe, apenas que da Inglaterra foram a Portugal, Espanha, Bélgica e França, retornando Maeda a Belém em 1917, onde finalmente fixou residência terminando uma vida de nômade e com ela as lutas e desafios. Sabe-se porém que pelo menos mais duas lutas foram por ele efetuadas:
A primeira na chegada a Belém contra um capoeirista famoso chamado “Pé de Bola”, que foi apenas mais um a conhecer a força de Conde Koma. Essa luta aconteceu em frente ao Cine Popular no Bairro de Nazeré, mediante termo de responsabilidade assinado por ambos os lutadores. Media “Pé de Bola” 1,90 m. de altura e pesava 100 quilos. Sua segunda luta sim, tem importância transcendental, pois foi travada exatamente contra o seu companheiro de tantas andanças Nobushiro Satake, em 1919, no Theatro Politheama em Manaus, sendo esta a sua primeira e única derrota em mais de mil combates.
Deve-se entretanto levar em consideração que em Belém não havia adversários e tampouco com quem treinar, portanto, estava Maeda praticamente parado. Assim ele ofereceu a aquele que desde o início de sua carreira no Kodokan o acompanhou por mil e uma aventuras nesse peregrinar pelo mundo inteiro, como a um irmão, a glória e honra da sua primeira e última derrota(*)
(*) – Sabe-se que Satake viveu em Manaus até 1948. Casou-se com uma amazonense e teve duas filhas, voltando para o Japão em 1945. Conta-se ainda que, no seu retorno da Inglaterra, voltou Maeda acompanhado de D. May Íris, com quem viveu até o fim de seus dias. Tiveram uma filha adotiva chamada Celeste, sextanista de medicina que entretanto trancou sua matrícula para casar-se nos Estados Unidos com um oficial desse país de nome Stanley Aracim, que conhecera quando estacionado em Belém durante a Segunda Guerra Mundial. Na Guerra do Vietnã, em visita ao marido com os seus dois filhos, morre Celeste em desastre de aviação. Salvam-se os dois filhos. Uma outra filha foi adotada por D. May Íris após a morte de Maeda, D. Clívia que ainda hoje (1991) vive em companhia do marido e de seus filhos em Belém.
Mesmo afastado das disputas Maeda ainda efetuava algumas demonstrações e ensinava a sua arte nas proximidades da sua cidade. Teria sido em 1922 aproximadamente quando montou a sua academia de judô num barracão medindo 4×4 m., na sede do Clube do Remo na Cidade Velha, e cujo “tatame” era de serragem e coberto de lona.(*)
(*) – Essa academia teria sido montada após uma hipotética viagem ao Japão a chamado do Prof. Jigoro Kano. Teria ela permanecido no Clube do Remo até 1923 mais ou menos, depois até a década de cinqüenta no Corpo de Bombeiros, e em continuidade na igreja N.S. Aparecida no bairro de Pedreira, e finalmente no SESI até os dias de hoje (1991), encontrando-se sob os cuidados do Prof. Alfredo Mendes Coimbra.
Entretanto, o grande sonho de Maeda ainda estava por se realizar, e esse sonho como sabemos, era transformar a Amazônia numa segunda pátria japonesa, e com isso em mente dedicou todo o seu tempo após instalar-se na capital paraense, trabalhando incansavelmente em promover a vinda e a instalação dos seus compatriotas… Porém, esse seu sonho não se realizou, não na grandeza dos seus ideais, restando de toda essa luta a então colônia de Tomé de Açu e pouco mais.
Saudoso de sua pátria, ansiando por voltar a pisar o seu solo e rever pessoas, coisas e lugares que guardava na lembrança, já com a saúde abalada por insidiosa doença, passava os dias triste meditando numa vida de glórias e que agora se aproximava do fim … O fim do guerreiro !
Cercado do amor e do Carinho de sua esposa May Íris e de sua filha Celeste, falece em sua residência na Vila Bolonha, nº 04, em Belém do Pará no dia 28 de novembro de 1941.
Morre assim o HERÓI DA AMAZÔNIA … E DO JUDÔ !!!.
Fonte: Sensei MESSIAS RODARTE CORREA
FAIXA VERMELHA 9º DAN